O grupo criminoso que praticava corrupção no Departamento de Água e Esgoto de Várzea Grande (DAE-VG) gerou prejuízo de R$ 11 milhões aos cofres públicos. Os envolvidos no esquema tratavam as proprinas recebidas pelo nome de "Pocotó".
Conversas interceptadas envolvendo o diretor comercial do DAE, Alessandro Macaúbas Leite de Campos, com outros servidores mostra como funcionava o esquema ou parte dele.
Em uma das ligações, uma pessoa identificada como "HNI (Hein)" comunica-se com Anderson Kleiton Correa Botelho, atendente comercial do DAE, e afirma que Alessandro mandou duas ligações (abastecimento de água) para serem realizadas. A pessoa sugere que Anderson ligue para Alessandro alegando que está sem PEAD (um tipo de tubo para encanamento). O comunicante ainda enfatiza que o diretor deseja que o serviço seja feito com material do DAE. Ele também menciona que enviou a solicitação para "Joãozinho", o qual estaria com a ordem.
Anderson questiona se haverá o "pocotó".
HNI: "HNI- "Hein Alessandro mandou duas ligações aqui pra fazer ai pra ele, aí cê liga pra ele, fala que cê tá sem PEAD (tipo de tubo para encanamento) ele quer que faz com material daí do DAE, eu mandei pra Joãozinho lá, Joãozinho tá com a ordem lá, com os negócio, aí cê fala pra ele, nois ta sem PEAD,ai se pega PEAD ai!"
Anderson: "E o 'pocotó', vai ter o 'pocotó'?"
HNI- Não sei se tem o "pocotó", pra mim ele não falou nada, ele falou que é pra fazer!" (sic)
Em um segundo caso, em uma conversa realizada dentro da unidade da Diretoria Comercial, servidores conversam entre si sobre a necessidade de pagamento de propina para que sejam executados os serviços rotineiros do DAE.
A nova conversa já envolve outro investigado, Aguinaldo Lourenço da Costa Silva – Ouvidor da autarquia. Ele aponta os dias que podem ser realizados os "pedidos" do diretor comercial.
"Mas a gente pode fazer com que ocorra antes, 3 dias, 2 dias a gente faz a ligação!"
Aos risos: "Mediante o quê? Mediante propina (Risos de todos)".
Entre outras conversas, Alessandro Macaúbas cita ser o "braço direito do vereador Pablo Pereira" e acerto de um cargo na Diretoria Comercial do DAE/VG, para uma mulher (que não terá a identidade revelada).
"Conquanto que ela trabalhe na campanha de Pablo à reeleição", diz trecho do documento.
ESQUEMA NO DAE
A Delegacia Especializada de Combate à Corrupção (Deccor), da Polícia Civil de Mato Grosso, deflagrou, na sexta-feira (20.09), a Operação Gota d’Água para desarticular uma organização criminosa instalada na Diretoria Comercial do do DAE, que resultou na prisão do vereador Pablo Pereira (União Brasil) e outros servidores do DAE.
Foram cumpridos na operação 123 mandados judiciais, expedidos pelo Juízo do Núcleo de Inquéritos Policiais de Cuiabá (Nipo), entre prisões preventivas, busca e apreensão, suspensão de função pública, sequestro de bens e bloqueio de valores e medidas cautelares diversas.
Entre as ordens judiciais estão 25 mandados de busca e apreensão domiciliar e pessoal em endereços vinculados a 22 pessoas investigadas.
No total foram decretadas 11 prisões preventivas e 18 ordens de suspensão do exercício da função pública. Estão sendo afastados das funções 15 servidores da Diretoria Comercial do DAE-VG; um servidor da Câmara de Vereadores do município; um funcionário de uma empresa terceirizada que presta serviços na Diretoria Comercial do DAE. Um vereador de Várzea Grande teve a prisão decretada e determinação de afastamento do mandato parlamentar.
Também foram determinadas cinco medidas cautelares diversas contra 11 investigados (dentre os quais, sete são servidores da Diretoria Comercial do DAE e um é ex-servidor do mesmo setor). As principais são: proibição de manterem contato entre si e com os demais investigados; acessar os prédios e dependências do DAE e de manterem contato e se aproximarem das testemunhas
Cobrança por serviços
Durante a investigação da Deccor foi identificada a cobrança de valores, por servidores públicos, para a execução de serviços que eram devidos pelo DAE aos consumidores. Auditorias ainda revelaram prejuízos para a autarquia em razão da exclusão ilegal de débitos e também em razão de diminuição indevida de valores de faturas, tudo mediante recebimento de dinheiro por servidores.
Em relação apenas às duas últimas espécies de fraudes, a estimativa é que desde 2019, a autarquia tenha sofrido um prejuízo de aproximadamente R$ 11,3 milhões.
Foi determinado o sequestro de 6 imóveis e 26 veículos, além do bloqueio de valores das contas dos 22 investigados no valor do prejuízo estimado.
Outra providência determinada pelo Nipo foi a realização de auditoria em todas as modificações de valores de contas de água que foram feitas pela Diretoria Comercial do DAE-VG, desde 2019.
A pedido da Polícia Civil, a Justiça também proibiu tanto o Poder Executivo de Várzea Grande quanto o Poder Legislativo do município de nomear ou contratar qualquer um dos investigados para exercer cargos na administração municipal.
Organização criminosa
No decorrer das investigações, foram apontadas diversas espécies de fraudes e uma ação corrupta na Diretoria Comercial do DAE, praticadas pela organização criminosa, pelo menos desde o ano de 2019 e até a atualidade. Ao que tudo indica, em qualquer ocasião que fosse possível obter valores indevidos em razão da prestação do serviço público de saneamento básico, uma significativa parte dos servidores da Diretoria Comercial do DAE não hesitava em receber os valores ilegais.
Foram identificadas diversas situações em que foi dificultado o acesso da população várzea-grandense à ligação de água, com problemas artificialmente criados, além de diversas situações de cobrança de propina. Segundo elementos probatórios coletados, alguns servidores realizavam o trabalho rotineiro apenas mediante pagamento de propina. E a situação era de conhecimento do chefe do setor, que é apontado como um dos líderes da organização criminosa.
O outro líder indicado é o vereador Pablo, que tinha como principal função exercer pressão política com a finalidade de fazer valer os objetivos do grupo criminoso.
Diligências revelaram o aparelhamento da Diretoria Comercial do DAE para exploração política pelo vereador, demonstrando a atuação ordenada de diversos servidores em favor da campanha à reeleição, com uso da estrutura pública da autarquia municipal. Em razão disso, foi determinada a remessa de cópia da investigação para o Ministério Público Eleitoral, para adoção das providências pertinentes.
A Operação Gota d’Água está em sua segunda fase. Na primeira fase foram realizadas medidas probatórias, todas com autorização judicial, e oitivas de mais de 80 testemunhas e declarantes e requisitados documentos ao órgão.
A operação contou com o apoio de mais de 120 policiais das unidades da Diretoria de Atividades Especiais e da Diretoria Metropolitana da Polícia Civil para o cumprimento das ordens judiciais.
Com informações do VGNotícias