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Opinião Sexta-feira, 31 de Janeiro de 2025, 15:34 - A | A

Sexta-feira, 31 de Janeiro de 2025, 15h:34 - A | A

JAQUELINE LARRÉA

Tratamento do transtorno do espectro autista (TEA) pelo plano de saúde

Jaqueline Larréa*

TEA EM NÚMEROS

Há uma estimativa de que mais de 2 milhões de pessoas sejam autistas no Brasil, dado esse extraído de uma pesquisa realizada pelo CDC – Center of Deseases Control and Prevention, que é uma instituição dos Estados Unidos, que concluiu que 1 a cada 110 pessoas tenha a condição.

É importante registrar que a condição gera consequências em outros aspectos, uma vez que a literatura científica aponta que 49% possuem alguma doença crônica ou secundária identificada junto ao diagnóstico de o transtorno do espectro autista – TEA.

A conclusão dos estudos científicos à disposição é de que a saúde da pessoa autista é mais vulnerável que a população em geral, sobretudo em doenças comuns como questões gastrointestinais (16%), doenças respiratórias (10%) e obesidade (6%)[1].

Chama atenção uma pesquisa da Tismo.me[2] a respeito do suicídio entre pessoas autistas, que aponta um número 8 (oito) vezes maior na tentativa de suicídio feita por autistas em relação à população em geral.

Esses dados são preocupantes e deve refletir o cuidado especial que os portadores da condição devem receber de toda a sociedade, em especial dos profissionais de saúde que os assistem.

DIREITO IRRESTRITO AO TRATAMENTO NECESSÁRIO

Nessa linha, é importante frisar que o plano de saúde não pode limitar o tratamento dos beneficiários portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo o transtorno do espectro autista – TEA.

A operadora deverá oferecer atendimento por prestador apto a executar o método ou técnica indicados pelo médico assistente para o devido tratamento.

Isso é o que consta na Resolução Normativa nº 465 de 2021 que é o famoso ROL DA ANS, veja:

Art. 6º (...)

§ 4º Para a cobertura dos procedimentos que envolvam o tratamento/manejo dos beneficiários portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo o transtorno do espectro autista, a operadora deverá oferecer atendimento por prestador apto a executar o método ou técnica indicados pelo médico assistente para tratar a doença ou agravo do paciente.

Não raras vezes os planos de saúde negam autorização de tratamento para os beneficiários com TEA alegando ausência de previsão no rol da ANS. Ainda, os planos de saúde, por vezes, tentam obrigar os beneficiários a utilizarem a rede própria de atendimento, sem comprovar que os profissionais estão habilitados a executar determinado método ou técnica (ABA, bobath, pediasuit, therasuit, etc).

Contudo, ao proceder desta forma o plano de saúde está desobedecendo frontalmente o que prescreve o parágrafo 4º do art. 6º da RN 465/2021 da ANS.

Corroborando, o Superior Tribunal de Justiça possui precedente jurisprudencial no sentido de determinar a cobertura do tratamento multidisciplinar – inclusive com musicoterapia – para pessoa com transtorno do espectro autista – TEA[3].

DESCREDENCIAMENTO DA REDE PRESTADORA PELOS PLANOS DE SAÚDE

Importa ainda esclarecer que diante dos reflexos da condição na vida cotidiana, mudanças bruscas na linha de tratamento ou ainda no profissional que acompanha o beneficiário, podem causar consequências severas.

Por isso, os pais ou os responsáveis que assistem aos portadores de TEA podem discordar de mudanças de prestadores por descredenciamento unilateral da operadora, de forma imotivada.

Há precedentes de decisões no Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso que aponta de forma clara e inequívoca que o descredenciamento é um direito contratual da operadora, no entanto, deve se ressalvar a continuidade do tratamento dos beneficiários em atendimento e de todos aqueles que já se utilizaram do serviço do prestador e necessitarem de novos atendimentos.

Isso acontece porque o cliente, quando contrata uma operadora ou quando mantem seu contrato de plano de saúde, considera a rede de atendimento para realizar essa opção, o que vincula a operadora na garantia do atendimento por aquele prestador.

Há profundo respeito à essa condição neurológica que se reflete nas normativas e jurisprudência pátrias, que devem ser garantidas às pessoas com TEA.

Lembre-se: a saúde é um direito, não hesite em exigir o que é seu por direito.

 

 

Jaqueline Larréa é advogada e sócia do escritório Larréa, Larréa e Menezes, atua há mais de uma década na defesa de direitos relacionados à saúde. Siga nas redes sociais: @jaquelinelarrea / @larrealarreaemenezes

[1] https://veja.abril.com.br/saude/com-falta-de-dados-pesquisa-tenta-captar-a-realidade-do-autismo-no-brasil
[2] https://tismoo.com.br
[3] https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/12042023-Tratamento-multidisciplinar-de-autismo-deve-ser-coberto-de-maneira-ampla-por-plano-de-saude.aspx

Acórdão no REsp 2.043.003.

Cuiabá MT, 15 de Fevereiro de 2025