As chuvas de março são sempre muito fortes. Provocam enchentes, e estas, não raramente, promovem desabrigados. Muitas pessoas, nestas condições, perdem todos seus pertences. Sentem-se impotentes, incapazes de reagir. Isto, talvez seja, o pior de tudo. Sensação desesperadora. A mesma que dezenas, centenas e milhares estão tendo agora, ainda que não tenham havido cheias, mas as ondas e as correntezas feitas pelo Covid-19 são desastrosas, com perdas irreparáveis. Perdas que causam uma dor terrível, cujas feridas não são cicatrizáveis. Afinal, ninguém sossega diante das mortes que são tantas, mais tantas, que o redemoinho causado varre as esperanças restantes. Nem ao menos, ficam gotículas do esperançar. Pois inexistem vagas nas UTIs e nas enfermarias, ao passo que cresce, assustadoramente, a demanda.
Uma demanda que assusta, amedronta e preocupa. Preocupação que se agrava com o compasso lento, quase como os passos de uma tartaruga, da vacinação. Falam-se os agentes públicos. Fazem eco os agentes políticos. Repicam na imprensa. Mas nada de um planejamento, de planos de ações, tampouco de um trabalho conjunto, de mãos dadas entre a União, Estados e municípios. Afinal, diz o artigo 196 da Constituição Federal: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
O que se vê, lê e ouve nada tem de relevante, com governantes se pegando em brigas de ruas: de um lado o presidente com governador paulista, de outro o governador mato-grossense e o prefeito cuiabano. Cada um desses senhores tem seus próprios coros. Coros que realçam e dão forças as bobagens ditas por eles. Coros compostas de bajuladores sem cargos e de bajuladores com cargos. Coros, cujas vozes são, na verdade, ecos das falações daqueles senhores em brigas, e se espalham de forma rápida e com eficiência, até porque se valem da imprensa, de grupos de whatsapp e das redes sociais. Replicadas se tornam bem maiores, uma vez que se associam as versões surgidas, mas com um fim, um propósito bem definido, componente de uma tática, com o objetivo de angariar dividendos político-eleitorais para seus bajulados, pugilistas de ruas, os quais visam tão somente seus interesses. Interesses nas eleições de 2022. Dai seus empenhos nas brigas de agora. Briga que nenhum benefício traz ao país, unidade e ao município. Pois, em momento algum, pensam-se no coletivo, na imensa maioria da população.
Ainda que grande parte da população tenha se acomodado na arquibancada tão somente como torcedor. Torcem ou para “A”, ou para “B”, ou para “C”, ou para “D”, ou quem sabe, talvez, para “A” e “B”, ou para “B” e “C”. Tem-se, desse modo, o espetáculo. Espetáculo de péssimo gosto, de pior “script”, de roteiro desastroso. Desastre bem maior com os números cada vez maiores de mortes. Retrato, cujo negativo rebaixa a nota do Estado, desqualifica os gestores em brigas, e afasta o que ainda resta de esperança. Quadro que está longe, muito longe do papel de verdadeiros estadistas. Estadistas há muito inexistentes. Aliás, os verdadeiros estadistas tornam-se visíveis justamente na adversidade, em um cenário de caos, de terra arrasada. Se até agora, eles não pareceram, jamais aparecerão, pois já se completou, há dias, um ano de pandemia. E o que se viu até o momento, claro, não foi outra coisa senão erros e mais erros, seguidos de acusações mútuas. Pobre país, pobre torrão mato-grossense, pobre terra cuiabana, que completara seus 302 anos de existência, com vidas ceifadas de muitos de seus filhos, adotivos ou de nascimentos, por conta do vendaval do coronavirus e da incompetência de gestores. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.