A crise financeira enfrentada pelos produtores rurais em Mato Grosso e em todo o Brasil se intensifica e ameaça comprometer a sustentabilidade de uma das principais cadeias econômicas do país. A avaliação é da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), que voltou a alertar para o avanço do endividamento agrícola, motivado pela combinação entre queda nas cotações das commodities, alta dos custos de produção, juros elevados e ausência de políticas públicas estruturantes.
Atualmente, a dívida do setor rural brasileiro já ultrapassa os R$ 706 bilhões, de acordo com dados do Banco Central. Em Mato Grosso, estado que lidera a produção de grãos no país, o chamado “efeito tesoura” — quando os custos seguem altos e a receita despenca — vem reduzindo a margem de lucro ao mínimo. Para cobrir o custo médio de R$ 7.118 por hectare, o produtor precisa colher pelo menos 62 sacas de soja, enquanto em algumas regiões a saca está sendo vendida abaixo de R$ 110. Em 2022, o mesmo produto chegou a valer R$ 191,50.
“O que estamos vivendo é uma crise silenciosa, que poucos têm coragem de admitir por medo do julgamento. A queda no preço das commodities, somada ao custo altíssimo por hectare, aos juros escorchantes e à pior relação de troca da década, está levando milhares de produtores ao endividamento crescente e, em alguns casos, à insolvência”, afirma o presidente da Aprosoja-MT, Lucas Costa Beber.
A entidade também chama atenção para o aumento das recuperações judiciais e o colapso das relações de crédito no campo. Segundo a associação, produtores têm virado credores sem garantia, muitas vezes após entregarem produção a empresas em recuperação ou comprarem insumos que jamais foram entregues. Ao mesmo tempo, medidas recentes do Governo Federal, como o aumento do IOF e a taxação de produtos financeiros voltados ao agronegócio (como LCAs), dificultam ainda mais o acesso ao crédito.
A Aprosoja defende cinco ações prioritárias: securitização das dívidas, crédito emergencial com juros compatíveis à renda atual, revisão dos modelos de barter, garantia de preço mínimo para grãos e suspensão de encargos financeiros sobre o crédito agrícola.
O diretor administrativo da entidade, Diego Bertuol, criticou a falta de planejamento do Governo Federal no atual Plano Safra.
“Sem crédito acessível e com prazos e taxas compatíveis com a realidade do campo, há risco de perda diária plantada, redução de empregos e impactos severos na economia de centenas de municípios mato-grossenses”, declarou.
Além disso, Bertuol reforça que os produtores estão descapitalizados, mesmo com lavouras tecnicamente viáveis.
“A inadimplência que chega a quase 30% dos produtores rurais não é fruto de má gestão, mas sim de um cenário adverso que combina instabilidade climática, custos elevados e uma política de crédito que não acompanhou a nova realidade do campo”, disse.
A Aprosoja também destaca que boa parte das políticas atuais ainda seguem moldes da década de 1970, enquanto a complexidade da agricultura moderna exige soluções mais ágeis e adaptadas ao contexto global.
“As propostas que fazemos não são um pedido de favor, mas sim medidas de segurança econômica e alimentar”, acrescentou Bertuol.
Por fim, a entidade reforça que a crise no campo é sentida nas cidades, onde o agronegócio sustenta empregos, comércio e arrecadação. O colapso de uma safra não impacta apenas a fazenda, mas toda a cadeia econômica local e estadual.